terça-feira, 24 de maio de 2011

Copa do mundo 2014 e Olimpíadas 2016: Circo no Brasil Sem Pão





Ao ouvir a primeira vez essa notícia todo o Brasil festejou, vislumbrando seu país se destacar no mundo. O que dirá então da emoção dos nativos dessas doze cidades onde acontecerão os jogos, e a expectativa pela construção dos sofisticadíssimos estádios para milhares de pessoas. Que emoção será termos um mega-acampamento mundial em nossa pátria amada!

Se não fosse esse espírito de inferioridade diante dos países de "primeiro mundo" e a alienação das conseqüências dessa notícia, ao invés de festejarmos teríamos um luto nacional como nunca antes. "Porque motivo de tristeza?" – alguém perguntaria - "Veja a ótima oportunidade de nossos brasileiros ganharem dinheiro. Comerciantes, imobiliárias, empresas de marketing, inclusive proprietários de apartamentos e porque não os próprios comerciantes ambulantes?" Que tal mudar o foco da pergunta para: Quem serão, de fato, os principais beneficiados com isso? Quem pagará esses eventos? Como o mundo será acomodado no Brasil nesse período?

Será que os brasileiros ainda se lembram as conseqüências dos jogos Panamericanos de 2007, quando se assistiu ao desperdício de recursos públicos em obras super-faturadas e o abandono de promessas que geraram expectativas na sociedade de benefício social?! Se não se lembram, creio que, pelo menos, aqueles que costumam ler jornal terão uma leve lembrança do que aconteceu na Ásia e África.

Nos jogos olímpicos da China em 2008 houve o despejo calculado em um milhão de famílias carentes na reforma urbanística. Em Nova Deli na Índia, o Commonwealth Games causou um enorme despejo de favelas onde milhares de famílias ficaram desabrigadas. No Cazaquistão a construção de estádios para os Jogos Asiáticos de inverno fez com que trezentas famílias fossem removidas, e receberam uma compensação financeira que não supriu em nada suas necessidades. O mais recente é o caso da Cidade do Cabo na África do Sul em que “o governo já havia, há muitos anos, anunciado a intenção de urbanizar uma favela enorme com 20 mil moradores. E o que acabou acontecendo é que pessoas que foram removidas para habitações temporárias – para que ficassem nessa condição provisória até a reurbanização e redesenho do assentamento – até hoje permanecem nessa condição provisória. Muitos residem em ‘casas’ que apelidadas ‘microondas’, porque são contêineres feitos de metal”. 

Ou seja, com todos esses exemplos citados, é evidente que no Brasil a copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016 acarretará graves conseqüências econômica e social, principalmente sobre a população mais vulnerável o que já está acontecendo. 

Desde Novembro de 2010, organizações sociais, estudantes e movimentos populares de vários estados do Brasil tem realizado encontros para se discutir sobre essa questão. Representantes de cada estado puderam compartilhar de como o governo e as prefeituras já estão tomando medidas extremamente rígidas de reformas urbanas. Em Fortaleza a policia tem reprimido violentamente os moradores de rua e camelôs. No Rio de Janeiro e Belo Horizonte favelas estão sendo demolidas e famílias desalojadas sem uma adequada compensação. Várias famílias de movimento sem-teto foram despejadas e estão nas ruas. No Rio Grande do Sul sete comunidades próximo ao estádio beira-rio foram totalmente destruídas para espaços imobiliários. Muitas dessas famílias desapropriadas estão sendo retiradas de lugares estrategicamente de re-urbanização e próximo aos estádios, e sendo remanejadas cada vez mais para as periferias sem suporte algum.

Em São Paulo, está havendo a chamada política de higienização que consiste em “limpar” o centro. Moradores de rua estão apanhando e sendo jogados de um lado para o outro, na cracolândia a polícia está agredindo e ameaçando os usuários de forma intensa, famílias sem-teto são remanejadas para lugares praticamente inacessíveis. Barracos em comunidades como do Rodo-anel e Favela do Sapo na Zona-leste foram derrubadas por completo somando um despejo de setecentas famílias. 
A relatora da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito à moradia adequada Raquel Rolnik tem organizado esses encontros de discussão e participação. 

Tenho acompanhado todos esses projetos para a Copa e isso posso te dizer com muita segurança. Acompanho os protocolos que têm sido assinados entre o governo federal, os governos estaduais e prefeituras que envolvem a Copa do Mundo. Nenhum deixava claro qual será o destino da família. O meu grande temor é que a maior parte das famílias receba simplesmente o “cheque-despejo”. Joga na mão delas um cheque, às vezes, de R$ 5 mil, de R$ 3 mil, de R$ 8 mil, que todos nós sabemos que é absolutamente insuficiente para sequer comprar um barraco de favela. diz Rolnik. 

Diante de tamanha desumanidade e exploração do direito humano, grande parte da classe social “imune”, nem se dá conta de que essas coisas estão acontecendo, ou se ouvem falar, acreditam ser uma medida legítima da jurisprudência governamental. Aliás, ainda existem aqueles que, mesmo sabendo de tudo o que está acontecendo por trás desses mega-eventos, questionam: porque eu me preocuparia com algo que não está me “atingindo”? As aspas do “imune” e “atingido” respondem esse questionamento dizendo que mesmo que a desgraça do próximo não cause nenhum tipo de indignação ou compaixão, todos os cidadãos brasileiros trabalhadores de classe média sofrerão um injusto impacto financeiro. 

A relatora da ONU Raquel Rolnik diz que “o governo brasileiro assumiu a posição de que o dinheiro público seria utilizado para obras de infraestrutura e mobilidade. Em relação aos estádios, seria pegar empréstimos de um banco público para investir nos estádios e, ao investir nos estádios, depois pagar de volta ao banco. Ele estaria atuando exatamente como ele atua hoje em vários ramos empresariais. Isso já acontece. Entretanto, está entrando dinheiro público sim, de uma maneira completamente indireta, mas eu vou citar alguns exemplos. É o caso do estádio do Atlético Paranaense, em Curitiba. O Atlético, um clube privado, que teoricamente iria fazer a reforma de seu estádio, falando que iria se endividar, não iria pegar dinheiro do BNDES de acordo com que a FIFA pedia. Tem esse detalhe. A Fifa é a entidade mais corrupta de que se tem notícia.” Ou seja, com todos esses gastos de infraestrutura, seja ela, imobiliária, urbanística, ferroviária, e outras, o Tribunal de Contas da União (TCU) elaborou um relatório de orçamento onde ficou previsto um investimento total de R$ 23 bilhões. R$ 23 bilhões que sairão do seu bolso; R$ 23 bilhões somente para um mês de jogos; R$ 23 bilhões que poderia tirar todas as crianças de rua da praça da Sé e construir muitos conjuntos habitacionais para famílias de baixa-renda; R$ 23 bilhões que trarão alegria para os mais ricos e pranto para os mais pobres.

Caro irmão ou irmã leitor(a) tenho que ser realista e dizer que esses eventos esportivos vão acontecer, mas nesse rumo que está acontecendo, deve ser urgentemente barrado. Não podemos nos omitir diante da desvalorização dos direitos humanos. Como seguidores daquele que foi contra todo sistema opressor, temos de nos posicionar em favor dos oprimidos e contra os opressores. A sua igreja, sua comunidade, sua paróquia, tem força e voz para uma mobilização ativa no conselho de bairro, somando forças nesses encontros sobre o tema, fomentando abaixo-assinados via internet, no envolvimento de lutas populares. 

A Bíblia mostra que nosso relacionamento com Deus está intimamente ligado ao relacionamento com o próximo. Contextualizando Mateus 25: “Senhor, quando te vimos sendo despejado, ou quando vimos o Senhor apanhando da polícia sem motivo, e quando vimos as prefeituras e o governo te fazerem de marionete?”...

Reivindicar os direitos dos mais pobres e vitimados é uma forma legítima de adoração ao Criador. 

Um comentário:

  1. Muito oportuno e verdadeiro o seu artigo. Peço permissão para publicá-lo em meu blog, com referência à fonte:
    www.mirantesul.blogspot.com
    Aguardo sua manifestação, podendo ser no próprio blog, clicando em comentários ou pelo presente email.

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